Por que é tão difícil? Por que não faço mais vezes? Por que parece que estou fracassando?
Hoje eu desisti de uma coisa. Não interessa o quê, eu simplesmente desisti. Foi difícil, porque me disseram que eu me arrependeria, que não era a coisa certa a se fazer. “Como assim você vai desistir?” Me perguntaram. Dei de ombros. “Desistindo”, disse, e me olharam como se eu estivesse louca. Por que é loucura deixar de lado aquilo em que eu não me encaixo mais? Parece sinal de fraqueza, mas desistir é sinal de fortalecimento. De novas direções, de mudar a seta, mirar ao contrário.
Me fez bem, desistir. Eu sei que vou encarar as pessoas que nãoi entendem, ainda muitas vezes, e ter que explicar desse meu jeito dando de ombros e com poucas palavras, ainda algumas vezes, mas um dia passa. Um dia essa desistência vai parecer a coisa certa, e ninguém mais vai lembrar que um dia eu estive nesse lugar, desistindo, jogando as páginas para o alto “não quero mais”, sendo teimosa. Desistente. Fraca. Inconsequente. “Mas você não pensa no seu futuro?”, “é tão simples, é só fazer… você é foda”. Foda, aqui, usado no sentido contrário de ser realmente foda, ou como a gente conhece, incrível. Foda aqui sendo usado como “você não presta”. Tá. Tudo bem. Eu desisti de aceitar essas críticas também. E estou me sentindo foda—no sentido certo. Não consigo me sentir fraca. Me sinto como se tivesse uma ferida, e ela está lentamente cicatrizando. Porque eu parei de forçar seu tratamento e a deixei curar sozinha. E está curando. Está melhorando.
Eu estou melhorando.

Eu estou desistindo de pequenos caminhos e traçando longos, sinuosos, difíceis de compreender, mas que fazem eu me sentir foda. No único sentido que eu sei usar a palavra. 



Estou com saudade de escrever, saudade de digitar e sentir as teclas macias do teclado ganhando vida sob meus dedos. Estou com saudade de acordar com uma cena do livro na minha cabeça, grudada de forma tão forte que não sai até que eu a coloque para fora em forma de palavras e sorrisos e digitação. Escrever, escrever, escrever. Estou com saudade dos personagens, dos diálogos, das longas cenas apaixonadas, de beijos e abraços e risadas e conversas no meio da noite, vivendo como se eu tivesse passado por aquelas situações, mas na verdade só querendo, querendo, querendo ser aquela pessoa que eu mesma criei, me sentindo esquisita por amar uma pessoa que nunca, nunca, nunca existiu. É triste e é incrível ao mesmo tempo. Inacreditável, eu diria, como eu consegui—como nós escritores conseguimos—criar pessoas tão reais, e mesmo assim ter certeza de que elas não existem. Esse texto está ficando terrível, horrível, horrendo, porque eu estou colocando para fora tudo o que eu penso e eu não sou meus personagens, eu não sou de mentira. Eu sou de verdade, e pessoas de verdade tendem a enrolar, encher linguiça, serem rastejantes, pensar rápido e não evoluir nem um pouquinho. Não sou um dos meus personagens, mas queria ser. Sou não-ficção, mas adoraria ser um romance. 



Hoje parei pra pensar. 

Quando abri meu e-mail, não fiz o que faço todo dia, deixando o cérebro ir no automático. Eu parei e prestei atenção no meu endereço de e-mail. Aquele que eu uso para praticamente tudo, sabe? O que eu preciso ditar para as pessoas, porque ninguém entende o significado e acha que alguma coisa pornográfica está escrita ali. Eu queria contar a todas as pessoas que já me perguntaram porque eu escolhi esse endereço de e-mail, a história por trás disso. 
Mas eu não conto. 

Aí eu lembrei de você. 

Na verdade, sem querer, todos os dias eu penso em você. 

Meu cérebro tem um lugar especial, onde ele sempre vai quando está se sentindo inseguro, e encontra conforto lá. Esse lugar é onde estão guardadas todas as memórias com você. Estão ali reunidas todas as gargalhadas que demos juntas, todas as histórias sem pé nem cabeça que inventávamos e todas as piadas internas que, eu tenho certeza, ninguém mais entenderia. 

Olhando pro meu endereço de e-mail, comecei a pensar em todas as partes da minha vida que só existem por sua causa. Posso afirmar com certeza que é mais que 50% de tudo o que vivi, tudo de importante que vivi depois que te conheci. Estou escrevendo por sua causa, porque senti sua falta e decidi falar sozinha, ir naquele lugar confortável do meu cérebro, sentar ali por uma hora e só deixar as memórias passarem como numa apresentação em slide. Uma memória atrás da outra. Uma memória boa, uma não tão boa assim. Uma memória muito boa. Um momento em que você, e só você, esteve ali para me amparar quando eu pensei que o mundo inteiro estava caindo na minha cabeça, e eu nunca poderia segurá-lo sem a sua ajuda. Sinto que, na verdade, você tirou o peso dos meus ombros, nessas horas, e o colocou inteiro nos seus. Porque você segurava nós duas, equilibrava as dores que eu não conseguia suportar e as tomava como suas. Você sempre apareceu quando eu precisava, quando eu estava me sentindo pra baixo, e também quando eu estava me sentindo feliz demais e precisava de você para comentar todo tipo de coisas boas como você fazia. 

Eu parei pra pensar, e lembrei de como você é bonita. 

Uma pessoa bonita. Por fora, você tem os olhinhos pequenos, o sorriso avantajado - mas só para quem merece - o corpo minúsculo, tão inadequado para a quantidade de sentimentos bons que você carrega consigo. Mas deve ser proporcional, no final das contas, porque o tanto que você tem, você distribui, e sempre está precisando de mais. De mais afeto, de carinho e de pessoas ao seu lado. 

É por isso que eu estou aqui, e sempre vou estar aqui, mesmo você não vendo; eu sei que você sabe disso, independente da distância e toda a confusão que é a vida. 

Eu parei pra pensar, e senti sua falta como nunca havia sentido antes. 

Eu parei pra pensar, e estou pensando até agora. 

Eu parei pra pensar, e comecei sorrindo. 

E acabei chorando.

eu te amo. 



Eu quero flores. 
Quero comida na cama, cachorro pulando nos lençóis, farejando. Quero sentir o cheiro de café logo pela manhã, abraçar teu corpo quente, seminu. Quero tranquilidade, uma música no fundo, dançar pela casa. Quero ter um bom dia, aprender a arranhar o violão, entrar para a academia, mas nunca ir, porque na verdade você gosta do meu corpo como ele é, e eu nunca quis mesmo perder aqueles três quilinhos que estão circulando por aqui. Quero sorrir com um gesto bobo, sonhar acordada. Quero vinho às três da tarde, banho de chuva à meia-noite. Quero uma vida pacata, numa casinha apertada, onde nossos livros se amontoam pelos cantos, pois não cabem mais estantes nos corredores. Quero cheiro de torrada enchendo minhas narinas e aquela sensação de que já fiz isso mil e uma vezes, mas estou disposta a contar muito mais. Eu quero seu cheirinho na minha camiseta favorita e todos os seus horários decorados na minha mente, porque meu calendário está adaptado para receber suas folgas. Eu quero você de manhã, acordando comigo, e de noite, me contando como foi seu dia. Quero assistir nosso filme favorito pela quarta vez na mesma semana e ainda rir nas partes mais bobas. Quero uma vida. Qualquer vida, só aquela vida onde você é o centro e a marginal. Onde você é quem faz o sinal e eu vou, deito-me na cama e me torno um pedaço de você, uma vida. 



Não adianta tentar, esse negócio de "fazer a coisa certa" não existe. 
Por mais que você tente, a coisa certa escapole das mãos, corre entre os dedos e vai embora, porque, na verdade, ela nunca existiu. Qual o conceito de coisa certa?
Sempre vai ter alguém que irá apontar o dedo e dizer que você está errado. Pois é! E você aí achando que estava fazendo a coisa certa. Esses dias eu acordei às onze horas da manhã, porque a noite anterior me tirou o sono, não consegui dormir mesmo. E lá estava eu, descansando. É a coisa certa a se fazer, afinal, eu estava tirando as oito horas de sono diárias que é recomendável para manter a saúde e a mente funcionando corretamente. Mas, num resumo malfeito do que é ser adulto, a regra é básica: você deve acordar cedo e tocar a vida. Sim. Eu sei. Eu teria que acordar cedo e tocar a vida, mas eu não trabalho fora de casa. Meus horários são regulados por mim, então eu decidi que naquele dia eu iria dormir mais tarde e acordar, consequentemente, um pouquinho mais tarde. Achei que seria a coisa certa a se fazer, por diversos motivos. Chegando à minha casa às onze horas, algumas pessoas cochicharam como era uma vergonha eu ainda estar na cama numa hora daquelas. Mas, oras, eu tinha meus motivos. Para mim, eu estava fazendo a coisa certa. Mas não era não. Apontaram o dedo para mim e acusaram-me de ser preguiçosa. Só que não viram que, na noite anterior, às três horas da manhã, eu estava trabalhando, colocando a mente em ação, criando. Tsc. Ninguém sabia dessa parte, mas mesmo assim houve julgamentos. Porque ninguém tem o direito de dizer se o que eu fiz, ou o que o vizinho, que terminou o relacionamento saudável de uma hora para a outra, ou o que aquela prima que decidiu sair de casa aos dezessete anos fez, ou o que aquele amigo que começou a se alimentar mal só porque estava magro demais fez, é a coisa certa ou errada. Quando diz respeito a apenas uma pessoa, é ela quem decide se aquilo é certo. Estou certa? 
Pois é. Vai ter gente que ainda vai dizer que não. 



Esses dias aí eu tava pensando sobre últimas palavras. É foda pensar sobre isso, porque quanto mais a gente pensa, mais a gente fica pensando sobre isso. É como um ciclo vicioso, e é chato, porque pensar sobre isso faz crescer uma paranoia dentro da gente. Minha vó acabou de me perguntar se eu vou comprar o pão e eu disse que não, aí entrei em casa. Parei, olhei pra trás e pensei: essas não podem ser as últimas palavras da minha avó pra mim. Não é possível. Mas é possível sim. Acontece muito mais do que a gente pensa, porque na verdade quase ninguém vive falando coisas poéticas por aí, então a chance de ter uma delas como última palavra é mínima. Agora, toda vez que saio de casa ou minha mãe vai ali na casa de uma amiga no fim da rua, fico pensando: será que "beleza" vai ser nossas últimas palavras? Eu espero que não. Ai grito, do meio da escada um "se cuida aí" porque eu não sei dizer "te amo", simplesmente não sei, e minha mãe me pergunta se eu estou ficando maluca. Ela é assim mesmo, nunca gostou de demonstrar nenhum tipo de cuidado com ninguém, embora ela queira. Ela não diz, mas não quer dizer que não sente. Então, ela foi lá e disse que eu tava maluca porque tinha mandado ela se cuidar. Que coisa louca, né? Vejo todas essas famílias por aí que se abraçam no ano novo e dizem coisas como: eu te amo muito, felicidades nesse próximo ano. Na última virada de ano eu abracei meu pai e disse "obrigada por tudo". Foi um ano bom pra a gente, e ele me ajudou demais, então eu pensei em agradecer. Isso resultou em um abraço desconfortável e um silêncio doloroso. Mas depois eu ri, porque sei que ele não sabe falar coisas desse tipo também. Pra mim já foi um sacrifício, imagina pra ele, que me ensinou a ser assim. Enfim, foi engraçado e uma merda ao mesmo tempo. Voltando as últimas palavras, minha avó morreu um ano desses ai e nossas últimas palavras foram sorrisos. Eu sorri pra ela, sorri muito, porque ela estava no hospital e eu não sei o que falar quando alguém está no hospital. Eu não sei o que falar em momento nenhum, quase, mas isso aí não posso mudar, ta comigo mesmo, então aceitei. No hospital, eu sorri bastante e minha avó ficou me olhando assim, lembrando de mim, e quando eu fui embora, beijei sua mão e soltei. Ela não soltou minha mão. Ela segurou, ficou me olhando até alguém me apressar, e eu disse: tenho que ir agora, mãe (todos os netos chamavam ela assim mesmo), mas eu volto na próxima semana.
Eu não voltei, porque ela morreu uns dias depois disso, e a última coisa que eu disse a ela foi uma mentira sem querer, mas não serve pra mim como últimas palavras. Pra mim, as nossas últimas palavras foram sorrisos, lembranças e beijos. É isso que quero dizer, as vezes não falamos nada, e essas são nossas últimas palavras. 



Ah, o egoísmo. 

Crescemos acreditando que é a pior coisa. Você não pode ser egoísta. Está entre os xingamentos mais cruéis e entre as características que tendem a afastar e separar os casais. Mas, o que é o egoísmo?

É feio pensar em nós mesmos, de quando em quando?

Quer dizer que, se eu fizer algo porque eu gosto, pensando em mim, em meu bem-estar e só nisso, estou sendo egoísta? Se você acha que sim, bem, sinto muito, mas você não vai gostar nada do rumo que esse texto tomará. 

Para mim, a ideia do egoísmo feio veio do medo de alcançar coisas sozinho, e aí acabar perdendo quem está ao seu redor, por receio de que a pessoa, a oportunidade, a chance, vá embora. Mas não vai. Vai por mim: você pode ser egoísta de vez em quando, sim. Não há nada de errado em pensar em si. Em querer o melhor para si! É o que nos faz um pouquinho humanos. Todo mundo tem um pouco de egoísmo dentro de si, só que alguns tentam mascará-lo com ações altruístas que, no fundo, no fundo, servem também para massagear o ego de quem tanto só pensa "nos outros", e está ali praticando uma ação "de graça", recebendo em troca, o quê? Exatamente: a satisfação. O orgulho e o sentimento de paz que invade nosso peito depois de nos depararmos com uma boa ação. Fazemos, 20%, para nos sentirmos bem. 

Então até os mais altruístas, são egoístas. 

Incrível, né?

Mas é assim mesmo. 

Essas coisas tomam tempo para entrar na cabeça. Mas, um dia, depois de tanto se deparar com essa palavra sendo usada de maneira errada, talvez você, nós, todos nós, começaremos a pensar de uma forma diferente.